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Remessa de produções asiáticas para o Brasil

Escrito por Mirian Lopes Cardia | Publicado: Quinta, 21 de Junho de 2018, 18h24 | Última atualização em Terça, 27 de Julho de 2021, 02h11

Carta enviada ao governador do Estado português na Índia, conde de Sarzedas, Bernardo José Maria Lorena e Silveira, e ao tenente coronel da armada de Goa José Joaquim da Silva Freitas por d. Rodrigo de Souza Coutinho recomendando a obtenção e o envio de sementes e mudas de plantas "asiáticas" que poderiam se adaptar ao clima e aos terrenos do Brasil. O ministro recomenda produtos que estavam entre os mais valorizados no comércio de especiarias, além de madeiras, café e até mesmo cavalos. Entre as sugestões, sementes de teca, canela do Ceilão, cardamomo, sândalo, cravo, noz moscada, cada uma dessas enviada de uma região diferente da Ásia, como Onor, Talacheira, Cananor, Goa, Alapé, Mangalor, Ilhas Malacas, Pulo Penang, entre outras.

Conjunto documental: Avisos e ofícios. Ministério dos Negócios Estrangeiros e da Guerra.
Notação: IJJ¹ 758
Datas-limite: 1808 -1808
Título do fundo: Série Interior
Código do fundo: A6
Argumento de pesquisa: agricultura
Data do documento: 12 de novembro de 1808
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): -

Leia esse documento na íntegra 

 

Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor = Sendo o constante cuidado de Sua Alteza Real, o príncipe regente[1] nosso senhor, promover por todos os modos o melhoramento e progresso dos seus vastos domínios do Brasil[2], cujos terrenos são certamente muito próprios, como vossa excelência conhece, para toda a qualidade de produções asiáticas[3], me ordena Sua Alteza Real que recomende ao zelo, e atividade de vossa excelência a diligência de fazer remeter para aqui sementes, e pequenas árvores de teca[4], que vossa excelência poderá haver com facilidade de Damão pelo governador de Alapé[5], pelo diretor da nação Francisco Gomes Arouca e de Goa[6] pelo chanceler Antônio Gomes Pereira e Silva, tendo Vossa Excelência a lembrança de ordenar que as sementes venham em vasos de vidros, muito bem tapados, para que possam chegar em estado de poderem produzir = Semelhantemente encarrega Sua Alteza Real a vossa excelência de fazer transplantar para aqui a canela[7] de Ceilão, e o cardamomo[8], o que Vossa Excelência poderá obter pelo citado diretor de Alapé que muito comodamente as transportará na sua corveta, que regularmente navega para Columbo e Ponta de Galé[9], sendo certo que este homem pelas suas circunstâncias poderá conseguir, e [engajar] uma pessoa que tenha a necessária inteligência para descascar a canela e que sendo natural da Ilha de Ceilão terá a vantagem de falar o português baixo, que é língua franca em toda a Costa de Malabar[10] = Não menos seriam a desejar as árvores de sândalo[11], que poderiam vir de Onor, Mangalor, Talacheira, Cananor[12] e Alapé, uma vez que vossa excelência as pedisse ao enviado britânico do governo general de Bengala[13], pois que este certamente lhas faria haver muito prontamente pelos diferentes coletores daqueles distritos = O cravo[14] e a noz moscada[15] merecem igual atenção, e desejo de se haverem, e portanto não omitirá vossa excelência também esta diligência ocorrendo a lembrança de poder haver estes artigos das Ilhas Molucas[16], e de Pulo Penang[17] por algum capitão hábil dos que navegam de Macau[18] e Timor[19] para aqueles Portos, e posto que o café[20], deste país particularmente, é já quase semelhante ao de Moca[21], com tudo como o de Goa se reputa igual a este, não deixe vossa excelência de ir enviando progressivamente pequenos pés desta árvore quando ofereça oportuna ocasião. = Finalmente incumbe Sua Alteza Real a vossa excelência a tentativa de enviar para aqui alguns cavalos pais do país dos Persas, e Árabes, com algumas éguas escolhidas, a fim de melhorar as raças, e conseguir este importante objeto, que tanto se tem negligenciado no Brasil. E por que para tudo isto devem ser necessárias somas maiores do que permitem as poucas facilidades das finanças desse Estado, vossa excelência indicará desta despesa para lhe ser imediatamente satisfeita e segurarei a vossa excelência que a execução desta Reais Ordens manifestando o reconhecido zelo, e atividade de vossa excelência será um serviço que Sua Alteza Real terá sempre muito presente = Deus guarde a Vossa Excelência = Palácio do Rio de Janeiro em 12 de novembro de 1808 = D. Rodrigo de Souza Coutinho[22] = Senhor Conde de Sarzedas[23] = José Joaquim da Silva Freitas

 

[1]JOÃO VI, D. (1767-1826): segundo filho de d. Maria I e d. Pedro III, se tornou herdeiro da Coroa com a morte do seu irmão primogênito, d. José, em 1788. Em 1785, casou-se com a infanta Dona Carlota Joaquina, filha do herdeiro do trono espanhol, Carlos IV que, na época, tinha apenas dez anos de idade. Tiveram nove filhos, entre eles d. Pedro, futuro imperador do Brasil. Assumiu a regência do Reino em 1792, no impedimento da mãe que foi considerada incapaz. Um dos últimos representantes do absolutismo, d. João VI viveu num período tumultuado. Foi sob o governo do então príncipe regente que Portugal enfrentou sérios problemas com a França de Napoleão Bonaparte, sendo invadido pelos exércitos franceses em 1807. Como decorrência dessa invasão, a família real e a Corte lisboeta partiram para o Brasil em novembro daquele ano, aportando em Salvador em janeiro de 1808. Dentre as medidas tomadas por d. João em relação ao Brasil estão a abertura dos portos às nações amigas; liberação para criação de manufaturas; criação do Banco do Brasil; fundação da Real Biblioteca; criação de escolas e academias e uma série de outros estabelecimentos dedicados ao ensino e à pesquisa, representando um importante fomento para o cenário cultural e social brasileiro. Em 1816, com a morte de d. Maria I, tornou-se d. João VI, rei de Portugal, Brasil e Algarves. Em 1821, retornou com a Corte para Portugal, deixando seu filho d. Pedro como regente.

[2] VASTOS DOMÍNIOS DO BRASIL: os domínios do Brasil, em princípios do século XIX, compreendiam as seguintes capitanias gerais e subalternas: Bahia, Rio de Janeiro, Pernambuco, Minas Gerais, São Paulo, Pará, Maranhão, Goiás, Mato Grosso, Ceará, São José do Rio Negro, Piauí, Rio Grande (do Norte), Paraíba, Espírito Santo, Santa Catarina e São Pedro do Rio Grande. Estas capitanias estavam sob a administração central da Coroa, com o nome de Estado do Brasil, cuja sede, a partir de 1763, passou a ser o Rio de Janeiro. Entretanto, os domínios do Brasil englobavam também as antigas divisões administrativas e territoriais da América Portuguesa: Estado do Brasil e Estado do Maranhão, posteriormente, Estado do Grão-Pará e Maranhão. Criados em 1621, ainda sob o reinado de Filipe III da Espanha (durante a união ibérica), vigoraram até meados do século XVIII, quando a governação pombalina promoveu uma centralização administrativa da colônia. O Estado do Brasil compreendia capitanias de particulares e capitanias reais (incorporadas à Coroa por abandono, compra ou confisco), e era administrado por um conjunto de órgãos que foram se profissionalizando depois da segunda metade do século XVIII, com competências fazendária, civil, militar, eclesiástica, judiciária e política.

[3] ESPECIARIAS: Palavra proveniente do termo latim especia = substância. Tinha o sentido de substâncias raras e caras, usadas em pequenas quantidades, para fins de perfumaria, remédios e condimentos (principalmente na conservação dos alimentos). A necessidade do uso de especiarias e outros gêneros na alimentação e conservação foi um dos motores das grandes navegações no século XVI, em busca de novos caminhos para o Oriente e de terras onde se pudessem explorar essas riquezas. A noz-moscada, o gengibre, a canela, o cravo-da-índia, a pimenta (líder absoluta da preferência das importações), e, por algum tempo, o açúcar são alguns exemplos de especiarias apreciadas pelos europeus na Idade Moderna. O açúcar deixou de ser considerado uma especiaria com o início de seu consumo em massa, a partir da monocultura de cana-de-açúcar fomentada pelos portugueses. A expressão francesa “caro como pimenta” data desta época, sendo utilizada para caracterizar o alto preço de um algum produto, assim como o valor das especiarias.

[4] TECA: de nome científico Tectona grandis, a teca é uma árvore de alto porte, originária do sudeste asiático, cuja madeira foi muito utilizada pelos portugueses para a construção naval. Substituiu os pinheiros e carvalhos europeus, que antes constituíam a base das embarcações lusas. Sua madeira é de alta densidade, mas leve e muito resistente, ideal para grandes construções, como as naus, e ainda garantiam maior durabilidade. No entanto, se para Portugal era interessante o uso da árvore indiana, devido a sua resistência, por outro lado, era muito dispendioso produzir navios em Goa, em vez de Lisboa. Algumas sementes dessa madeira chegaram ao Brasil via Angola em 1788 e dez anos depois, foi solicitado ao vice-rei da Índia o envio de mudas de teca, oriundas de Damão para serem plantadas em solo brasileiro. Essa medida, adotada pela administração portuguesa de acordo com as ideias ilustradas, coincide com a perda de possessões portuguesas no Oriente, que levou à necessidade de aclimatar especiarias e drogas, além de outras plantas originárias da região da Índia, e que eram de grande importância para o consumo e comércio português com suas colônias e com outros estados europeus. Em 1802, o desembargador e letrado Baltasar da Silva Lisboa registrou que mudas de teca estavam sendo plantadas em toda parte do Brasil. Mas, foi na comarca de Ilhéus, Bahia, onde a árvore melhor se adaptou, sendo cultivada na região desde 1800.

[5]ALAPÉ: também chamada Allepey, atual Alappuzha, a cidade fica no estado de Kerala, extremo sudoeste da Índia, entre as cidades de Cochim (ao norte) e Trivandrum, atual Thiruvananthapuram, capital do reino de Travancor (ao sul). A região da costa do Malabar recebeu os primeiros portugueses que chegaram às Índias em 1498, com a viagem de Vasco da Gama. A cidade/distrito de Cochim começou a ser ocupada em 1500 e tornou-se o centro da presença portuguesa, à qual Alapé se submetia. A cidade ficou conhecida no século XX como a “Veneza do Oriente”, devido à sua formação repleta de canais, lagoas e rios. Durante a ocupação portuguesa no século XVI, foi centro irradiador das missões católicas na Índia, além de região do comércio de especiarias. Fazia parte da diocese de Cochim, do padroado português do Oriente, contando com a presença constante de missionários jesuítas que, empenhados na conversão da população indígena, construíram um colégio e seminário, além de igrejas e a catedral. No século XVII os portugueses foram expulsos pelos holandeses, remanescendo um núcleo de padres católicos em Allepey.

[6]GOA, DIU E DAMÃO: foram as maiores cidades do Estado português da Índia, grandes centros comerciais e polos receptores de gêneros e matérias-primas das outras regiões, a serem redistribuídos pelo Império luso. Embora os portugueses tenham se espalhado pela costa da Índia, foram essas as três regiões que permaneceram pontos ativos do império atlântico até o século XX (reconquistadas em 1961). Goa, a maior dessas cidades, situada na costa do Malabar, foi desde o século XV, a sede das possessões no sudeste asiático. Conquistada em 1510 por Afonso de Albuquerque, era uma região estratégica, cercada de áreas de produção agrícola, recebia a maior quantidade de navios e cargas de outros pontos da península e proporcionava aos portugueses o controle de comércio do oceano índico. Goa foi um dos vértices do comércio luso no Atlântico – assim como Luanda, Lisboa, Salvador e Rio de Janeiro – e, embora o comércio com as possessões lusas na Índia tivesse entrado em decadência a partir do século XVIII (devido aos grandes gastos com guerras para mantê-las e ao contrabando, que diminuía consideravelmente os lucros da Coroa), a cidade permaneceu o ponto forte de Portugal na região. Ao longo do período colonial, os navios carregados de tecidos e outros produtos “finos” (como porcelanas e especiarias) da Índia deixavam os portos de Goa em direção a Luanda e, depois de uma escala em Salvador, iam para Lisboa, onde chegavam praticamente descarregados. A maior parte desses tecidos era vendida diretamente para os comerciantes destas cidades (o que levou ao aumento de impostos e à proibição da escala no Brasil). Depois da abertura dos portos do Brasil em 1808, o comércio com Lisboa enfraqueceu mais ainda, já que os navios eram diretamente direcionados para a África e depois para o Rio de Janeiro, de onde seriam redistribuídos para o restante do Império. Diu e Damão, localizadas respectivamente na costa de Guzerate e no golfo de Cambaia (ambos parte da região do Guzerate), mais ao norte da costa ocidental, foram peças-chave, desde o século XVI, no fornecimento de gêneros para o comércio metropolitano, sobretudo de tecidos de algodão, os mais finos reservados para envio a Lisboa por Goa, e os mais grosseiros a serem exportados para Moçambique, em troca de marfim, âmbar, ouro, escravos, entre outros.

[7]CANELA DA ÍNDIA: produto proveniente de uma árvore natural do Ceilão, onde se concentrava sua cultura e exploração. A canela (Cinnamomum zeylanicum Breyn) é utilizada em pau ou moída e das folhas extrai-se um óleo essencial utilizado na perfumaria e na fabricação de sabonetes. Foi uma das especiarias mais procuradas na Europa moderna, trazendo grandes lucros para seus comerciantes e passando por sucessivos monopólios do século XVI ao XVIII. Primeiramente, os portugueses ocuparam o Ceilão, estabelecendo um comércio em sistema de exclusivo. Em 1656, os holandeses, com a Companhia das Índias Orientais, e mais tarde, em 1796, os ingleses lucraram com a exploração dessa especiaria. No período colonial, o plantio foi por muito tempo proibido no Brasil, para não concorrer com o Oriente. Chegou a esta colônia pela mão dos padres jesuítas. A canela é empregada na culinária e faz parte da cozinha luso-brasileira. A ela atribuem-se também propriedades medicinais. Algumas espécies brasileiras fornecem madeira de lei.

[8]CARDAMOMO: planta derivada da mesma família do gengibre (zingiberaceae), a elettaria cardamomum é comumente usada para fins medicinais e culinários. Originária do sul da Índia, Sri Lanka, Malásia, Java, Sumatra, chegou a Europa ainda na Antiguidade pelas rotas do Oriente, tendo sido citada em tratados como o Corpus Hippocraticum. Durante a baixa Idade Média, além das sementes que chegavam via Constantinopla, a planta, que já era cultivada em mosteiros e apreciada por suas propriedades antissépticas, sendo mascada para atenuar o mau hálito e cuidar de doenças bucais, foi-se disseminando por todo o continente europeu. Entre os árabes, o cardamomo é muito consumido no café e, em algumas regiões da África Oriental, usado para fazer chá. Com a conquista do caminho marítimo para o Oriente, os portugueses passaram a embarcar o cardamomo nos portos da Costa do Malabar, principalmente vindo de Travancore, Cananore, Cochim e Calicute. A vagem de cor esverdeada e suas preciosas sementes aromáticas de sabor picante eram usadas como condimento e também para perfumar, além dos usos farmacêuticos, o que a tornava uma das especiarias mais caras do mundo até os dias de hoje. Os maiores produtores continuam sendo os países do Oriente asiático e do sul da Índia, mas também é produzida em larga escala na Guatemala. No Brasil, registra-se a presença do cardamomo em praticamente todo o território, mas não há uma produção expressiva, ao contrário do que desejavam os administradores portugueses quando transplantaram a especiaria para a colônia.

[9]COLUMBO E PORTO DE GALÉ: tanto Columbo ou Colombo (atual Kotte, capital) quanto Ponta de Galé foram cidades localizadas na ilha de Ceilão, hoje Sri Lanka, onde os portugueses ergueram fortalezas e se estabeleceram a partir de 1505 para garantir o tráfico exclusivo de especiarias. A cidade foi portuguesa até o início do século XVII (1656), quando passaria ao controle dos holandeses. Ponta de Galé foi praça portuguesa até 1640. Também tomada, passou a servir como sede do governo holandês até esses conquistarem Columbo. Quando ocuparam o Ceilão no início do século XVI, os portugueses procuravam estabelecer alianças com os reinos locais, para facilitar a construção de feitorias e o comércio de especiarias. O primeiro aliado foi o Reino de Kotte, cuja capital era a cidade de Columbo. Por todo o reino de Kotte podiam se observar campos de canela, especiaria preciosa que ocupou papel importante no comércio ultramarino português. Os primeiros chegaram ao Ceilão em 1505, mas foi apenas em torno de 1520 que decidiram edificar fortificações para defesa das praças de comércio, apesar da Carreira das Índias ter sido planejada para estabelecer pontos de comércio e feitorias, e não cidades ou Estados, conforme aconteceu. A fortaleza de Galé tinha proteção natural de um rochedo, mas foi também reforçada por muralhas e baluartes. Muitas batalhas foram travadas entre os portugueses, os nativos de diversos reinos locais e os holandeses, desde que esses chegaram ao Ceilão em 1638. Apesar de contar com soldados e praças, Portugal não teve como sustentar a possessão dos territórios por muito tempo, e acabou deixando a valiosa ilha do Ceilão. Os holandeses também foram expulsos da região quando a Grã-Bretanha a invadiu e tomou grande parte do território da Índia, em finais do século XVIII. As batalhas pelo controle dessa ilha deixam claro como o comércio de especiarias era intenso e muito valioso.

[10]MALABAR: a costa do Malabar compreende geograficamente o lado ocidental da costa da Índia, entre a cidade de Goa e o estado de Kerala, o ponto mais ao sul do território, banhada pelo mar arábico. Foi a região na qual os primeiros navegadores europeus, portugueses, chegaram em busca de especiarias e produtos finos (louças e sedas) das "índias", e estabeleceram suas feitorias. Os principais pontos comerciais da costa foram as cidades de Goa, Cochim e Calicute, conquistadas e dominadas pelos portugueses durante séculos, a exceção da última, tomada pelos holandeses ainda no século XVI. Devido ao intenso contato com os europeus, principalmente portugueses, holandeses e ingleses, essas cidades tornaram-se bastante cosmopolitas e movimentadas, recebendo produtos (e influência) da África, de territórios árabes, de outras regiões na Índia e da Europa. A costa do Malabar era especializada na recepção, redistribuição e exportação de gêneros vindos de outras regiões, como o arroz proveniente da costa do Coromandel (lado oriental), mas também produzia sal, peixe, madeiras e vegetais, e era responsável pela maior parte da produção de especiarias, tão desejadas e disputadas pelos exploradores e comerciantes europeus. Essa região ainda foi porta de entrada de produtos da Europa, como por exemplo, a carne, o pão de trigo, o azeite, o vinho, os queijos e a manteiga, introduzidos pelos portugueses principalmente pela capital do Estado português na Índia, Goa. O Malabar manteve intenso comércio com a costa oriental da África (principalmente com Moçambique, colônia portuguesa), fornecendo gêneros agrícolas em troca de marfim e escravos, entre outros.

[11]SÂNDALO: árvore originária do sul da Índia e das ilhas do arquipélago da Indonésia, o sândalo (Santalum album) era muito conhecido e apreciado pela própria madeira, resistente e flexível, ideal para entalhar esculturas e pequenos objetos, e por suas propriedades aromatizantes, de onde se extraíam óleos vegetais muito usados na Europa para perfumaria e farmacêutica. Essa “droga”, considerada de luxo e com alto valor comercial, chamou a atenção dos portugueses, que traziam a madeira e os óleos principalmente de Timor e de suas possessões no sul da Índia. Com o declínio da Carreira das Índias, a rota estabelecida entre Lisboa e Goa ou Cochim na Índia, devido a guerras com ingleses, holandeses e povos nativos pelas cidades e portos, a Coroa empreendeu um esforço de aclimatar espécies orientais de alto valor no Brasil, desde o final do século XVIII, movimento intensificado no início do XIX com a transferência da Corte para o Rio de Janeiro e a criação do Jardim da Aclimação, atual Jardim Botânico. Há registros de remessa de sementes de sândalo em 1794 para a Bahia e o Pará, enviadas pelo governador da Índia, Francisco da Cunha e Meneses, provavelmente a primeira leva. Em 1798, foram solicitadas mais mudas da planta para “transplante” no Brasil, especialmente as vindas de Timor, de onde vinham as melhores madeiras e óleos do sândalo branco. Em 1800, outra leva foi enviada para a Bahia pelo governador Francisco Antônio da Veiga Cabral, assim como outras remessas ao longo do período joanino.

[12]ONOR (HONNAVAR), MANGALORE, TALACHEIRA (THALASSERY) E CANNANORE: cidades e fortalezas ocupadas pelos portugueses na Costa do Malabar no século XVII. Nos seus portos eram comercializadas especiarias como a pimenta (Mangalore e Cannanore) e o gengibre (Cannanore). Não eram expressivas neste comércio, mas também recebiam produtos de outras regiões da Índia que interessavam aos portugueses, como o arroz. Os portugueses se apoderaram desses territórios aproveitando-se das guerras que já existiam entre os nativos e árabes que também tomaram essas cidades. Retomaram as alianças com os reinos e governos locais e expulsaram os mouros. Com o declínio da Carreira das Índias – ligação marítima entre Lisboa e Goa – no início do século XIX, muitas dessas possessões deixaram de ser portuguesas, mas continuaram servindo de fonte para o tráfico de plantas valiosas e drogas naturais que foram enviadas para os jardins de aclimatação (jardins botânicos) do Brasil e de outros territórios lusos com a intenção de adaptá-las às demais colônias lusas para recuperar a exclusividade do comércio de especiarias. No ano de 1809, por exemplo, o conde de Sarzedas requisitou que fossem enviadas ao Brasil mudas de sândalo, originário da Índia, transferidas dessas cidades fortalezas.

[13] BENGUELA: província situada ao sul de Angola. Face ao clima temperado, foram desenvolvidas nessa região, várias culturas de subsistência importantes, tais como as da banana, açúcar, milho, algodão, além de hortaliças e da pesca. Destacou-se como principal porto de embarque de escravos para a América portuguesa. A partir do século XVII, verifica-se no Rio de Janeiro uma entrada maciça de escravos provenientes dessa província africana, tornando os “benguelas” o maior grupo étnico na cidade.

[14] CRAVO-DA-ÍNDIA: também chamado cravinho ou apenas cravo, o Syzigium aromaticum (L.) é uma das especiarias de uso mais antigo, principalmente no Oriente. Botão da flor do craveiro, o cravo, depois de seco, é usado para temperar e aromatizar pratos. É também conhecido por suas propriedades medicinais e de perfumaria, como um poderoso antisséptico (era mascado para refrescar o hálito) e usado para melhorar o odor de ambientes. O cravo-da-índia, juntamente com a pimenta, a canela e a noz moscada, era a especiaria mais consumida na Europa no século XV e uma das mais caras. Originária das ilhas Molucas, na Indonésia, já era bastante conhecida e utilizada na China desde os séculos III-II a.C. Durante a Idade Média entrou na rota dos comerciantes árabes que transportavam produtos orientais para a Europa, passando por Constantinopla. A partir do século VIII, o comércio e uso do cravo se intensificaram no Mediterrâneo a preços muito altos. Esse comércio lucrativo acabou também por impulsionar que os europeus, sobretudo os portugueses, se lançassem aos mares em busca de rotas que permitissem buscar o cravo diretamente das “índias” e monopolizar sua venda na Europa. Em 1511, os portugueses chegaram às Molucas e verificaram nas ilhas quantidade de cravo suficiente para abastecer o Reino e ainda vender o que excedesse. Até chegar ao mercado europeu, a mercadoria percorria um longo caminho: era, primeiramente, escoada para Malaca, depois Goa, só então seguindo para o Mediterrâneo. Tal trajeto encarecia o preço da especiaria e logo essa atividade tão lucrativa despertaria o interesse dos holandeses que chegaram às ilhas produtoras no início do XVII e conseguiram expulsar os portugueses, passando a controlar o comércio do cravo. O monopólio da produção restringiu-se ao Oriente e às ilhas até meados do Setecentos, quando o cravo começou a ser plantado com sucesso em regiões da África e das Américas. As primeiras mudas levadas para Caiena datam de 1773, e os registros oficiais apontam que chegaram ao Brasil, na Amazônia, em finais do XVIII. No entanto, a produção em larga escala só foi registrada no Oitocentos. Mapas comerciais e balanços do Estado do Grão-Pará e Maranhão apontam que já havia produção de cravo na região, que figurava entre as drogas do sertão, e que o produto já era exportado para Portugal em fins dos anos 1760.

[15]NOZ-MOSCADA: especiaria retirada da semente do fruto da moscadeira, árvore originária das ilhas de Banda no arquipélago das Molucas, Indonésia. Assim como outras especiarias, foi desconhecida dos ocidentais até a Idade Média, quando teve início a sua comercialização pelos mouros. A noz-moscada na Europa pelos mercados de Gênova e era distribuída no continente a preços elevados devido ao monopólio árabe. Mesmo assim, foi utilizada em grande escala na Europa, como conservante para alimentos, como tempero culinário e para os fabricantes de cerveja, na medicina – no início do século XVII, lhe era atribuída a cura de mais de 140 doenças – e na forma de perfume, para esconder os maus cheiros das ruas. Em 1511, os portugueses conquistaram Malaca, centro do comércio asiático, e descobriram a proveniência da especiaria, as ilhas de Banda, para onde foram enviados navios lusos, com o objetivo de estabelecer uma nova rota comercial da noz-moscada, livre dos atravessadores árabes. No curto espaço de tempo entre o início dos séculos XV e XVI, os portugueses conseguiram garantir o monopólio da produção nas Moluscas, que só foi quebrado quando os holandeses transferiram as primeiras moscadeiras para as Antilhas, obtendo sucesso. A ilha de Granada, no Caribe, é, até hoje, a maior produtora mundial de noz-moscada.

[16]MOLUCAS, ILHAS: arquipélago localizado na Indonésia, ao norte da ilha do Timor, é composto de mais de mil ilhas vulcânicas, atualmente dividido em duas províncias: Molucas e Molucas do Norte. As ilhas que compõem a província do Norte são as que ficaram conhecidas como as “ilhas das especiarias” na época da expansão europeia. Desde aproximadamente o século X, os árabes da região do Oriente Médio, e posteriormente os otomanos, estabeleceram comércio com os reinos das ilhas, que forneciam variadas especiarias – as mais nobres –, e outros produtos raros, como penas de aves exóticas. Essas mercadorias chegavam à Europa pela Rota do Oriente (via península arábica, Constantinopla até Veneza, principalmente), controlada pelos muçulmanos até as rotas marítimas serem estabelecidas pelos europeus no século XVI. No caso das Moluscas, sua localização geográfica era praticamente desconhecida, mantida em sigilo pelos árabes, para proteger um dos comércios mais lucrativos entre Oriente e Ocidente. Os primeiros navegadores a chegar às ilhas em 1511 foram os portugueses, depois de conquistarem Malaca, outro ponto estratégico comercial, tiveram notícia de onde ficariam as ilhas e acabaram desembarcando em Tenate, a maior cidade das Moluscas. A descoberta de uma rota alternativa para as célebres ilhas das especiarias proporcionou o monopólio da noz-moscada e do cravo da índia, nativas da região e não encontradas, até então, em nenhum outro lugar conhecido. Ambos tinham muitas utilidades, desde condimentos para alimentação, a usos como medicamento e na higiene dos europeus. Durante aproximadamente um século, os portugueses desfrutaram de imensas riquezas, abastecendo frotas de navios com diversos produtos nobres da região das ilhas, tornando-se o único fornecedor europeu, sem intermediação dos árabes. Em finais do XVI, os holandeses começaram as investidas nas ilhas e conseguiram dominar o comércio com os governos locais, expulsando os portugueses das Molucas e de seus preciosos produtos. Entretanto, não somente estes, mas outros europeus conseguiram transplantar com sucesso as duas árvores para outras colônias na África e nas Américas, fazendo com que as antes disputadas ilhas perdessem importância no comércio com os europeus ao longo do século XIX.

[17]PULO PENANG: Penang é uma ilha que fica a noroeste da península malaia, atualmente Malásia, no estreito de Malaca, tendo ao sul a ilha de Sumatra. A península divide os oceanos Índico e Pacífico, e essa localização privilegiada atraiu conquistadores desde o século VII, muçulmanos do Malabar, persas, siameses, indonésios, hindus e principalmente chineses, responsáveis pelo movimento do comércio de produtos finos e de luxo entre as ilhas vizinhas e outras regiões, entre a costa leste do continente africano e o leste asiático. A partir do século XVI, o Sultanato de Kedah, ao qual pertencia a ilha, passou a negociar também com os europeus que chegavam, os primeiros foram os portugueses, sucedidos por holandeses (século XVII), até a chegada dos britânicos em 1786, que dominaram e permaneceram na ilha e na península até meados do século XX. Os portugueses a chamavam de Pulo Penang, sendo que Pulo, na língua local queria dizer "ilha". Era a porta de entrada para o comércio asiático e para o acesso às valiosas especiarias e drogas da região da Indonésia. Entretanto, apesar da vantagem geográfica, Penang era usada pelos mercadores portugueses principalmente como posto de parada entre as longas viagens, onde reabasteciam os navios de água, provisões, faziam reparos e, naturalmente, carregavam de especiarias, não chegando a se configurar uma colônia ou fortaleza. O privilégio de comércio exclusivo dos portugueses com a ilha foi derrubado pela chegada dos holandeses e sua Companhia das Índias Orientais, que foram expulsos pelos ingleses, que arrendaram Penang do sultão em nome da Companhia Britânica das Índias Orientais, e avançaram pela península e pelas outras ilhas dos arquipélagos ao sul.

[18]MACAU: a partir de 1513, os portugueses começam a fazer comércio em portos nas proximidades da foz do rio Xi Jiang, na região de Cantão, sudeste chinês, e tentar estabelecer-se nas cidades da costa. Depois de muitas tentativas frustradas, conseguem se fixar na pequena cidade de Macau, uma colônia de pescadores, e, após a assinatura do acordo luso-chinês de 1554, obtêm autorização do imperador para ficarem. Em 1557, Portugal receberia autorização do império chinês para se estabelecer definitivamente em Macau, em troca do pagamento de taxas ao governo sínico. A partir de finais do século XVI, a colônia começou a avançar economicamente, como porto português no comércio asiático, especialmente na rota que saía de Goa e tinha como destino final a cidade de Nagasaki, atual Japão, fundada pelos portugueses em 1543. No início do século seguinte, Macau era um porto grande e movimentado e despertou interesse de outros europeus, como holandeses e britânicos, o que provavelmente impulsionou o estabelecimento de um governo geral luso na cidade, subordinado ao de Goa, sede do Estado português no Oriente. Em meados do século XVII, os comerciantes portugueses de Macau começaram a ver seus negócios e sua prosperidade econômica declinarem, em virtude da emergência de Hong-Kong, colônia britânica, que passou a ser o principal porto europeu na China. Somente em 1887, a China reconheceu a soberania de Portugal no território de Macau, condição que pouco se alterou até meados do século XX, quando a Revolução comunista de 1949 começou a despertar adeptos entre os chineses da cidade e tentativas de insurreição e integração à República Popular da China. Apesar de vários ataques e incidentes, Portugal manteve-se efetivamente no governo de Macau até 1999, quando se iniciou o processo de transferência para China.

[19]TIMOR LESTE: ilha localizada ao sul da Indonésia, que faz parte do arquipélago das Ilhas Sonda, perto da ilha de Java. O lado leste da ilha foi conquistado pelos portugueses entre 1512 e 1514, quando da primeira expedição comandada por Afonso de Albuquerque, após a conquista de Ormuz, Goa, Ceilão, Malaca e Molucas. Os principais produtos de interesse na ilha eram o sândalo, da variedade mais fina e valiosa, o mel e a cera, que já eram comercializados com os povos malaios das ilhas no entorno e com os chineses, desde o século XII, aproximadamente. No século XVI, os portugueses, já acompanhados de missionários jesuítas, estabeleceram alianças com os povos locais, e construíram feitorias de onde seriam exportadas as especiarias para a Europa. Não pretendiam estabelecer uma colônia na região, apenas um entreposto comercial. No entanto, em meados do século XVII, os holandeses, aliados aos reinos locais da Indonésia, ameaçaram invadir e ocupar o lado oriental da ilha, o que levou os lusos a estabelecer um governo e organizar a colônia. Em 1702, enviam o primeiro governador e a colonização do Timor português, como ficou conhecida até o século XX, foi iniciada. Para eliminar as disputas com o lado ocidental pertencente aos Países Baixos, foi assinado o Tratado de Lisboa em 1859, quando o território da ilha foi oficialmente dividido e as fronteiras acertadas. Entretanto, apesar dos acertos, a fronteira entre os dois lados continuaria em disputa até a 2ª Guerra Mundial, quando os japoneses invadiram a ilha. Portugal, que não havia se alinhado com nenhum lado no conflito, pede apoio aos Estados Unidos para garantir seu território. O lado oeste aproveitou a guerra e o enfraquecimento do poder dos holandeses para se unir oficialmente aos indonésios e proclamar sua adesão ao país independente da Indonésia. Já no lado oriental, não houve um movimento separatista imediato, permanecendo sob domínio luso. A separação definitiva de Portugal somente ocorreu em 2002, depois de ter sido invadido pela Indonésia em 1975 e passados mais de duas décadas em guerras civis, entre nacionalistas separatistas portugueses e indonésios, apoiados pelos Estados Unidos durante a Guerra Fria. A independência chegou para o Timor-Leste, nome adotado depois da separação de Portugal, destruído por anos de guerras, e o país precisou contar com a presença de tropas de paz da ONU, compostas por militares brasileiros, para garantir o fim de ataques e auxiliar na reconstrução das cidades.

[20] CAFÉ: planta de origem etíope da família das rubiáceas, começou a ser utilizada como bebida na Arábia. A expansão do consumo pela Europa deu-se entre os séculos XVII e XVIII, por suas qualidades estimulantes. Consta que sua introdução no Brasil, em 1727, foi feita pelo oficial português Francisco de Melo Palheta, que plantou as primeiras mudas no Pará. Ao longo do século XX, o café tornou-se uma bebida popular e seu consumo e produção se expandiram, principalmente a partir de 1865, quando passou a ser comercializado torrado e empacotado (anteriormente era vendido em grãos). Destacam-se no Brasil duas grandes fases de expansão cafeeira. A primeira, no início do Oitocentos até os anos 1850, teve início nas encostas do morro da Tijuca em plantações caseiras, até a expansão por todo o vale do rio Paraíba do Sul, a leste e oeste, com foco na região da cidade de Vassouras, o maior centro produtor da época. Nestas regiões, o café iniciou seu grande desenvolvimento pela abundância de terras férteis, pelo bom clima e pela mão de obra escrava disponível. Ocupou o lugar das plantações de cana, algodão e alimentos, gerando escassez e carestia dos gêneros de abastecimento, além de ter promovido a derrubada e queimada de grandes extensões da mata atlântica. A segunda fase, que se iniciou a partir de metade do século XIX, após a proibição do tráfico de escravos, foi marcada pela expansão das lavouras para São Paulo, seguindo o vale do Paraíba e avançando pelo oeste paulista, depois de 1870. A grande demanda de mão de obra promoveu um aumento no preço dos cativos e um despovoamento das áreas de produção de açúcar no Nordeste, sobretudo. As lavouras do café no Rio de Janeiro e de São Paulo gerou significativas divisas, e uma nova, poderosa e politicamente forte aristocracia rural, a dos “barões do café”. Embora lucrativo, o plantio do café desgastava muito rapidamente o solo, razão para a constante movimentação nas áreas de cultivo e declínio da produção na região fluminense. Outro problema era a carência do uso de novas técnicas e instrumentos. A adoção de ferramentas como o arado e de máquinas a vapor para o beneficiamento, e mesmo de procedimentos simples como o enfileiramento dos pés, só foram adotados a partir dos anos 1870. Essa era uma das razões para o café brasileiro ser considerado de qualidade inferior, se comparado ao de outros países, o que não impediu, no entanto, que, ao longo do período imperial, o Brasil fosse o responsável por 50% da produção mundial, número que aumentou para 75% nas primeiras décadas da República.

[21]MOCA: o café Moca (ou Moka, ou ainda Mocha) é uma variedade superior de café da espécie Coffea arabica, que era comercializada pelo porto de Moca, na península arábica, atual Iêmen. Entre os séculos XVI e XVII Moca foi um dos mais importantes mercados de café do mundo, sendo a esta época, a principal cidade do território otomano. Os portugueses já conheciam o porto desde o século XV, quando iniciaram as navegações pelo mar Vermelho, e posteriormente tornaram-se importadores e consumidores do café oriundo daquela localidade, bem como outros países da Europa. O café dessa região, que recebeu o mesmo nome, tem o grão um pouco menor e mais redondo do que outros do tipo arabica, e embora nativo da Etiópia, adaptou-se bem e foi muito cultivado na província. Conhecido principalmente pelo sabor peculiar que lembra o do chocolate, o café Moca é muito consumido até hoje no mundo, e diversas vezes o termo é usado para descrever não exatamente o café desta qualidade de grão, mas a bebida, café comum ao qual se adiciona chocolate.

[22] COUTINHO, RODRIGO DE SOUZA (1755-1812): afilhado do marquês de Pombal, este estadista português exerceu diversos cargos da administração do Império luso, como o de embaixador em Turim, ministro da Marinha e Domínios Ultramarinos (1796-1801) e presidente do Real Erário (1801-3). Veio para o Brasil em 1808, quando foi nomeado secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, permanecendo no posto até 1812, quando faleceu no Rio de Janeiro. D. Rodrigo foi aluno do Colégio dos Nobres e da Universidade de Coimbra, tendo viajado pela Europa e mantido contato com iluministas como o filósofo e matemático francês Jean Le Rond d’Alembert, um dos organizadores da Encyclopédie. Considerado um homem das Luzes, destacou-se por suas medidas visando a modernização e o desenvolvimento do reino. D. Rodrigo aproximou-se da geração de 1790, vista como antecipadora do processo de Independência, e foi o principal idealizador do império luso-brasileiro, no qual a centralidade caberia ao Brasil. Sob o seu ministério, o Brasil adquiriu novos contornos com a anexação da Guiana Francesa (1809) e da Banda Oriental do Uruguai (1811). Preocupado com o desenvolvimento econômico e cultural, bem como com a defesa do território, Souza Coutinho foi um partidário da influência inglesa no Brasil, patrocinando a assinatura dos chamados “tratados desiguais” de que é exemplo o Tratado de Aliança e Comércio com a Inglaterra [ver Tratados de 1810]. Responsável pela criação da Real Academia Militar (1810), foi ainda inspetor-geral do Gabinete de História Natural e do Jardim Botânico da Ajuda; inspetor da Biblioteca Pública de Lisboa e da Junta Econômica, Administrativa e Literária da Impressão Régia; conselheiro de Estado; Grã-Cruz das Ordens de Avis e da Torre e Espada. Em 1808, o estadista recebeu o título nobiliárquico de conde de Linhares.

[23] SILVEIRA, BERNARDO JOSÉ MARIA LORENA E (1756-1818): 5º conde de Sarzedas, foi capitão-general das capitanias de São Paulo (1788-1797) e de Minas Gerais (1797-1806), governador do Estado da Índia entre 1806 e 1816, além de conselheiro do Conselho Ultramarino, Grão-Cruz da Ordem de São Tiago e comendador da Ordem de Cristo. Bernardo Lorena foi destacado administrador colonial, promovendo a integração entre capital e interior com a melhoria dos meios de comunicação e transporte, para o escoamento mais eficiente da produção para os portos. Foi o responsável pela conclusão do processo dos inconfidentes (1798) – pelo qual recebeu o título de conde de Sarzedas – e pela abertura e calçamento da estrada entre São Paulo e Santos, primeira estrada pavimentada da colônia, obra de engenharia avançada, conhecida como “Calçada do Lorena”. No Vice-Reinado de Goa, Lorena recuperou o governo do Estado da Índia que vinha sendo controlado pelos ingleses, sob o pretexto de proteger as colônias portuguesas do avanço de Napoleão, antes mesmo da transferência da Corte para o Rio de Janeiro. Foi paulatinamente expulsando os regimentos britânicos até que, em 1813, já não houvesse mais nenhum. No entanto, o episódio controverso que envolve a vida de Lorena não diz respeito a suas atividades. Supostamente, ele era bastardo de d. José I com a marquesa de Távora. Essa importante família, em vingança da ofensa, teria articulado o assassinato do rei. A tentativa foi frustrada, mas todos os Távora diretamente ligados ao marquês foram condenados por crime de lesa-majestade e executados de forma exemplar em Lisboa em 1759. Suspeita-se que a conspiração contra os Távora possa ter sido encabeçada pelo conde de Oeiras (depois marquês de Pombal), que desejava alcançar a posição de principal ministro de d. José. Quem “adotou” Bernardo foi o governador de armas do Alentejo, Nuno Gaspar de Lorena, de quem herdou o nome. Durante o reinado mariano, a casa foi perdoada e teve seus bens recuperados. Os juízes que condenaram a família foram condenados, assim como o marquês de Pombal que foi exilado. D. Maria I tomou Bernardo, seu suposto irmão, sob sua proteção ajudando em sua educação e indicação para postos importantes na administração colonial.

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